As coxas doridas Coloridas Pelos tons de quem passou Como vento quente de Verão Levantando a areia da praia Num turbilhão. As coxas doridas Exauridas Pelas noites mal dormidas Bem acordadas Do tempo distraídas As coxas doridas Pelos músculos Que não são seus Nem teus Mas do mundo todo A girar As coxas doridas Desprotegidas Sem medo Sem mistério Sem pena Sem foco As coxas doridas Pela tecnologia Tão simples Dos corpos A amar.
As galinhas chegaram
Em dia de manifestação.
Vieram num caixote,
À hora da reunião.
Conheceram a capoeira nova,
Ainda não terminara o relatório.
Bateram as asas no quintal
Em pleno prime time noticiário.
E bicaram minhocas e bichos
Durante um registo no notário
E mais um conto do vigário.
Mal se pôs o sol, recolheram
- Era hora de fazer o jantar.
De madrugada, puseram um ovo,
Que às redes sociais foi parar.
E exploraram o seu novo ambiente
Sem pensar ou questionar
Como haviam ido ali parar
Ou como a terra continuava a rodar.
- A quê?! A rodar?!
Eram galinhas felizes
- Assim preferimos acreditar,
Cujo futuro era incerto
E ninguém podia adivinhar.
E, entre couves bicadas, cacarejos,
Gatos à espreita, ovos chocados,
Banhos de terra, plumas sacudidas,
Mal sabiam que ensinavam
Mais do que qualquer deus, mestre ou cientista,
Livro, site, jornal ou revista,
Apenas por existirem
Em todo seu esplendor,
Saboreando o momento
Sem qualquer pudor,
Disfrutando a vida,
Sem nenhuma dor.
Quando eu chego em casa nada me consola Você está sempre frito Lágrimas nos olhos, de tanta maconha Você é tão bonito
Você manda vir a pizza, eu como Me bota sobre a mesa, eu tomo, eu tomo Eu tomo, eu tomo, eu tomo Você não está entendendo Quase nada do que eu digo Eu quero ir-me embora Eu quero é dar o fora E quero que você venha comigo E quero que você venha comigo Eu me arrumo, eu limpo, engomo, eu não aguento Você está tão curtido Eu quero tocar fogo neste apartamento Você não acredita Traz sua roupa imunda, eu lavo Me deixa toda acesa, eu tomo, eu tomo Eu tomo, eu tomo, eu tomo Você tem que saber que eu quero correr mundo Correr perigo Eu quero é ir-me embora Eu quero dar o fora E quero que você venha comigo E quero que você venha comigo E quero que você venha comigo E quero que você venha comigo E quero que você venha comigo
+
Quotidiana
Todo dia ele faz tudo sempre igual Me acorda às seis horas da manhã Me sorri um sorriso pontual E me beija com a boca de hortelã
Todo dia ele diz que é pra eu me cuidar E que eu sou sua única mulher Diz que volta na hora do jantar E me beija com a boca de café
Todo dia eu só penso em poder parar Meio-dia eu só penso em dizer não Depois penso na vida pra levar E acendo outra boca do fogão.
Seis da tarde, como era de se esperar Ele chega e me acena do portão Diz que está muito louco pra deitar E me beija com a boca de machão
Toda noite ele diz pra eu não me afastar Meia-noite ele jura eterno amor E me aperta pra eu quase sufocar E despeja em meu corpo sua dor
Todo dia ele faz tudo sempre igual Me incomoda às seis horas da manhã Me sorri um sorriso pontual E me beija com a boca de hortelã
Todo dia ele diz que é pra eu me cuidar E que eu sou sua única mulher Diz que volta na hora do jantar E me beija com a boca de café
Todo dia eu só penso em poder parar Meio-dia eu só penso em dizer não Depois penso na vida pra levar E me calo com a boca de feijão
Seis da tarde, como era de se esperar Ele chega e me espreita do portão Diz que está muito louco pra deitar E me beija com a boca de machão
Toda noite ele diz pra eu não me afastar Meia-noite ele jura eterno amor E me aperta pra eu quase sufocar E despeja em meu corpo sua dor
Todo dia ele faz tudo sempre igual Me sacode às seis horas da manhã Me sorri um sorriso pontual E me beija com a boca de hortelã
The virus came with the wind
Sweeping streets and lives
Panic shut behind doors
Hope built behind screens
People deprived from touch
Touch touch touch
We touch everything
Every time, everyone
From our face
To our hearts
To touch is to be alive
Yet, isolation cures
Yet, isolation kills
We are not our bodies
Wash your soul
As you wash your hands
Wash all viruses away
To infect only love
And stay in touch
To stay alive.
Ser artista é ser abençoado. É ter uma doença tão grave que é a própria cura. É ser mais alto, dizia a outra. Tão alto que não se chega e nem cabe em lado nenhum. Tão alto que se desequilibra e tropeça e cai. É ser desequilibrado. É sentir tanto que nem sente mais nada. É hummmmmmmmmmmm... Do outro lado do aquário. Espelho do espelho. A gritar tanto que se acaba surdo, fechado no próprio mundo. Autista. Auto-ista. Ego. Isto. Ou aquilo. Eu sei lá o quê! Ser artista é sei lá o quê que não se entende nada do que anda para ali a fazer. É ter uma sorte. Sem saber a sorte que tem. Que sorte... Morte... Que morte? O artista não morre. O artista está morto antes de morrer. Porque vive tanto que não vive nada. Muito para além da vida. Sem medo, lá vai ele. Que sorte a do artista!
Today you called.
Everything stopped.
And suddenly the world
Was at peace again.
My breathing calmed,
Time passed slower
And that enormous distance
That keeps us apart
Was not ever there.
Today you called
And I realised I am
On the right way,
A way of love
A way from me
A way for you
To me.
Ontem, vi-te.
Não serve para nada
Ver-te.
E, no entanto,
Activa-me o sistema nervoso
Mais do que um café da manhã.
Mas até eu devia era deixar
De tomar café...
Porque realmente aquilo
Não serve para nada.
Só nos deixa nervosos
E dá-nos cabo das entranhas.
É assim como ver-te.
Por falar nisso,
Ontem, vi-te.