O teatro é um amador
Caixinha de mistérios e surpresas
O derradeiro impostor
Recosto-me na escuridão
E deixo-me encantar
Ali posso tudo
Posso cantar e voar
Posso matar e berrar
Posso rir descontrolada
Às gargalhadas
E até posso chorar
Com as vidas dos outros
Que ali são minhas também
E sempre sem me cansar
E no final ainda aplaudo
Faço vénias e encores
Desfaço-me em agradecimentos
Sorrindo aos espectadores
Depois saio altiva e sobranceira
Pela porta principal
Sem passar nos bastidores
E olho de esguelha
Quem pela rua despreocupado se passeia
Pobres ignorantes inconscientes
Que não se atrevem sequer a espreitar
Aquela meta-vida brilhante
Implosão contínua de glamour
Ali prontinha a rebentar com tudo
Onde se finge o que já era verdade
E nos convencemos do próprio engano
Qual labirinto infinito de trapaças
Em queda livre vertiginosa
De onde afinal nunca saímos
Porque mesmo antes de entrar
Já lá estávamos a contracenar.