9 March 2025

O Daniel morreu.
O Daniel morreu.
O Daniel morreu.
O Daniel morreu.
O Daniel morreu.
O Daniel morreu.
O Daniel morreu.
...
E, por mais que o repita,
Isto nunca vai fazer sentido.

17 February 2025

Dolmen

Celebremos a morte
Essa confirmação da vida
Há milhares de anos
Atravessando
Nossos corpos 
Empedernidos
Amolecidos
Moldados 
Enterrados
Transmutados
Gelados
Suados
Sempre juntos
No tempo e no espaço
Todos um só
Orgasmo.


16 February 2025

A Traça

A traça é peluda 
E vive poucos dias,
Apenas o suficiente 
Para experimentar o amor
- Como eu.

10 February 2025

A Clareza da Noite Escura

Cai a noite cerrada
Escura, silenciosa, suave.
E no breu impenetrável
Do seu pesado manto
Que tudo acolhe
A clareza da vida
Irrompe num grito surdo
Duro, cru, iluminado.
Na cegueira da dor
Tudo se reduz à essência
Do ser
Que brilha
No escuro...

Reflexão Eco-Mitológica sobre o Luto

Estou de luto pelo meu grande amigo e companheiro Daniel, uma espécie de alma gémea sem forma ou classificação possível que tive o privilégio de acompanhar ao longo de 25 anos das nossas vidas.

No dia em que recebi a notícia, partilhara ao almoço o meu profundo respeito pelo luto de criaturas não-humanas, como a orca que carregou a sua filha morta no nariz durante semanas ou a macaca que não largou o cadáver do seu bebé ao longo de mais de um mês, sempre apoiada pelos seus parceiros de cativeiro. Eu sei que não vou carregar nenhum cadáver indefinidamente. Mas também sei que a natureza nos inspira a vivermos os nossos lutos como, quando, onde e com quem mais faz sentido. Ao contrário de muitos humanos, até bem próximos de mim: "Tens que começar a ultrapassar"; "vais ver que isso vai passar com o tempo", entre mudanças de assunto e outras técnicas inúteis, etc. Pouco mais de uma semana se passou, mas eu continuo com o Daniel "no meu nariz" e ainda não estou preparada para o largar. Como a macaca, tenho um bando de amigos maravilhosos que partilharam da mesma sorte de o conhecer e viver enquanto foi possível - estamos a amparar-nos em rede, diariamente ligados e acolhidos uns pelos outros. 

A morte torna tudo muito claro. E o chamamento da natureza (e das suas lições) é inequívoco. Sentir o toque da terra nos pés, o som das ondas, o cheiro da erva, o sabor da fruta, as folhas das árvores a balançar... A natureza sabe exatamente como amparar a nossa dor da perda. E nós sabemos exatamente o que fazer, se nos abrirmos a ela. E isso inclui as suas histórias, que são as nossas, como a da deusa Nungeena, venerada no sudeste Australiano, que nos relembra o poder da restauração e da beleza, depois de uma praga de insetos venenosos ter destruído o mundo. Assim me encontro agora, em restauração, à redescoberta da beleza depois de uma "civilização" envenenada - à qual pertenço - ter levado uma parte tão importante do meu mundo. 

É hora de transformação.

1 February 2025

Wicked Little Town

Forgive me, for I did not know
'Cause I was just a girl, you were so much more

Than any god could ever plan
More than a woman or a man
Now I understand how much I took from you
That when everything starts breaking down
You take the pieces off the ground
Show this wicked town something beautiful and new

You think that luck has left you there
But maybe there's nothing up in the sky but air

And there's no mystical design
No cosmic lover preassigned
There's nothing you can find
That cannot be found
'Cause with all the changes you've been through
It seems the stranger's always you
Alone again in some new wicked little town

And when you've got no other choice
You know you can follow my voice
Through the dark turns and noise of this wicked little town

It's a wicked
Little town
Goodbye, wicked
Little town



by Stephen Trask

31 January 2025

O Ano da Serpente de Madeira

Despedimo-nos de ti no dia em que começou o Ano da Serpente de Madeira. Estavas bonito, sereno, azul como o céu limpo desse dia triste mas brilhante. Uma enxurrada de amor se precipitou a celebrar-te. Tantas vidas tu tocaste, tantos sorrisos arrancaste, tanto bem distribuíste... Apesar das lágrimas e soluços e suspiros, senti-me em paz e acolhi cada pessoa que me abraçava, sabendo que te abraçavam a ti também, meu amor, meu amigo, meu irmão - às vezes, até filho, marido... Meu parceiro, meu compincha, meu companheiro de uma vida tão plena. tão intensa, alegre e completa. Que sorte tive em me cruzar contigo (de novo, estou agora certa)! Que grata estou por ter tido o privilégio de partilhar contigo este amor sem formas, nem regras, nem objectivos, nem planos, nem expectativas. Que bela forma de viver! Que lindo caminho percorremos juntos, com tantos altos e baixos e montanhas e vales e distâncias e aproximações e rectas e encruzilhadas... Dançamos sempre bem! Abrindo clareiras na confusão, círculos de alegria na multidão que logo se transformavam em pólos de atracção irresistíveis - não havia quem não quisesse fazer parte daquela energia tão boa que emanávamos, desprendidos, generosos, livres. Até nós próprios queríamos fazer parte daquela onda que provocávamos e, de repente, não era mais nossa porque era de toda a gente, numa infinita espiral de meta-universos espelhando-se entre si. Fomos amor e seguimos sendo, nesta nova forma de nos relacionarmos - eu matéria, tu etéreo. É só mais uma das múltiplas variantes desta amizade inestimável, inesgotável que sempre nos uniu e continuará a unir até ao fim dos tempos... Até ao infinito e mais além! Continuemos a nossa dança, então. <3